As restrições
orçamentárias desta coluna infelizmente não têm permitido que ela
sirva para o que foi inventada: registrar os olhares de um torcedor
comum – o que não é comentarista, nem técnico, nem idiota -
sobre o desenrolar do mais fascinante campeonato esportivo do
planeta. Que normalmente nascem, desabrocham e morrem na arquibancada
ou no butiquim, seus lugares naturais. E digo isso só para que se
registre o que durante toda a semana que antecedeu a peleja contra os
chilenos apregoei aos quatro balcões: seria o mais duro jogo para o
Brasil, do ponto de vista emocional, em muitas copas. E não deu
outra. Eu, pelo menos, não lembro da última vez que nosso nível de
apreensão chegasse a alturas tamanhas.
E isso, senhores,
porque era o jogo da vida daquela seleção. Que não nasceu para ser
o Brasil, ou a Argentina, fazer o quê? Nasceu para desempenhar um
papel honroso, mas modesto, de força intermediária. Para tristeza
dos andinos, a sorte (ou a falta dela) colocou a Seleção Brasileira
em seu caminho por quatro vezes, o que não é nem um pouco comum. Só
que dessa vez eles tiveram um time particularmente bem montado, com
alguns bons valores individuais como Sanchez, Vidal, Medel, Mena,
Diaz, Silva. E o Brasil, por sua vez, ainda não tinha encontrado –
como, aliás, ainda não encontrou – o caminho de transformar a boa
qualidade da atual safra de seus jogadores no futebol imponente e
incontestável que bordou-lhe na camisa as cinco estrelas que ostenta
no peito, lado oposto ao direito. Sabia La Roja, portanto, que nunca dantes - e não se sabe quando outra vez, agora - um cenário mais favorável.
Preparei-me, então,
para um jogo de vida ou morte. Mas qual não foi minha surpresa
quando na metade do primeiro tempo dominávamos o jogo e o placar, a
despeito de Neymar ter sido alijado da partida por uma “paulistinha”
certeira, no melhor estilo dos nossos queridos rivais andinos. Talvez
o tênue relaxamento que me passou no coração após o gol tenha
sido o mesmo que tomou conta do Escrete. Num lance infantil, tomamos
o empate: falha técnica do limitado Hulk, que fazia sua melhor
partida nesta Copa; bobeira imperdoável de um simpático mas
perigosamente irregular David Luiz, que alterna grandes lances, tanto
no desarme como quando vai à frente, com falhas que se tornam
naturalmente mais comprometedoras quanto mais o certame vai se
afunilando.
E daí para frente não
houve paz para o coração brasileiro. Acertado no intervalo, o Chile
veio para o segundo tempo melhor, jogando o futebol que mostrou na
primeira fase, e não no primeiro tempo. E o Brasil sem Neymar, sem
armação, sem nosso grande Fred sacado precipitadamente por Dom
Felipe, segurou-se como foi possível. E foi o que foi com direito a
bola chilena no travessão aos 14 do segundo tempo da prorrogação.
Repito, para os que encontrarem este papiro numa gruta daqui dois mil
anos: bola no travessão aos 14 do segundo tempo da prorrogação...
E ao fim e ao cabo prevaleceu a estrela do dedicado Júlio César, o
Nosso Júlio César, que resgatou a dívida que lhe tirava a paz de
espírito desde 2010. E a nossa. Melhor para o Brasil! Que siga,
aliviado, realizando o bom Mundial que até agora tem feito. Axé!
E diferentemente dos
detratores de plantão, imortais, invencíveis, ganhemos nós todas
as copas daqui até o apocalipse, acho que, como meu coração, o
Escrete saiu fortalecido desse jogo. Passamos pelo pior,
sobrevivemos. O que vier, daqui pra frente, será dentro das quatro
linhas. Bola. E bola nós temos. Como têm Alemanha, Argentina,
França, Holanda e mesmo esta boa Colômbia 2014. Na bola será
disputada essa Copa. Alvíssaras!
Sigo com fé em que
aquilo que ainda continua faltando dará o ar da graça, no momento
exato, na hora em que mais precisarmos. Nosso jogo está ali, nos pés
dessa geração que pode não ser excepcional, mas é muito boa. O
jogo está ali, eu quase o vejo. Que venha o efó, o
(des)encantamento, a aletheia, o desvelamento.
Que assim seja. Axé.